Ter um filho, ou um cão?

Convivemos com vários casais que não têm filhos, muitos têm cães ou outros animais de estimação. Certa vez, um colega nos disse que o cachorrinho era sua criancinha e que todo casal deveria ter um cão antes de ter um filho, para treinar! Já tivemos cães e temos filhos; garantimos que cuidar de humanos é infinitamente melhor e, também, mais recompensador. Além disso, o casamento foi pensado por Deus para formar família, não para satisfação própria do casal ou para cuidar de animais. De fato, na cerimônia do casamento pergunta-se aos noivos: “Estais dispostos a receber amorosamente os filhos como dom de Deus e a educá-los segundo a lei de Cristo e da sua Igreja?”
O Catecismo da Igreja Católica ensina que o Matrimônio é uma verdadeira vocação cristã (CIC 1602-1605), ou seja, quem tem vocação para o casamento, é chamado por Deus a ser santo através desse sacramento. A santidade é meta para todos os batizados e deve ser atingida por meio da “plenitude da vida cristã e [da] perfeição da caridade” (Lumen Gentium, 40). A vida do cristão torna-se plena quando ele procura viver as virtudes cristãs de modo heroico, numa entrega alegre e sem limites aos planos de Deus. O que há de mais belo nisso é que Deus mesmo nos dá graça para alcançarmos uma meta tão elevada como a santidade. Mas precisamos confiar totalmente nEle. Quando se trata de vocação e santidade, não há lugar para meias-entregas. O Senhor nos quer por inteiro.
A virtude da generosidade é a chave para concretizar essa entrega a Deus na vocação em que Ele nos chamou. O marido e a esposa devem compreender que o único modo de cumprirem o desejo de Deus para eles é a entrega abnegada no casamento. Generosidade na fidelidade, no emprego do tempo, no empenho em amar mais, na doação total de si, e na geração e educação dos filhos. Sendo esta última justamente a finalidade do matrimônio que é o seu “ponto alto” e “coroa” (CIC 1652). Para aqueles que têm vocação ao matrimônio, gerar e educar os filhos que Deus lhes der é o caminho concreto para alcançarem a santidade. Naturalmente, o matrimônio é um bem para os esposos em si, e por isso, mesmo aqueles que não podem ter filhos, santificam-se por meio desse sacramento.
Entretanto, é preciso ir além de simplesmente ter um filho. Se o casal entende que o casamento é uma vocação à santidade e que os filhos são parte concreta dessa vocação, então poderão concluir que a generosidade no número de filhos é algo que Deus espera deles. Esclarecendo: Deus não vai indicar um número concreto de filhos: quatro filhos para a Maria e o João, sete para a Clara e o Tiago. Nada disso, Ele pede que o próprio casal decida isso, mas mais importante: tome essa decisão com extrema generosidade. O papa Francisco, em uma homilia do dia 27 de maio do ano passado, comentou que, hoje em dia, infelizmente muitos pais católicos comportam-se como egoístas pois pensam: Não, eu não quero mais um filho, porque não poderemos viajar de férias, não poderemos ir a tal lugar, não poderemos comprar uma casa! (...) Nós queremos seguir o Senhor, mas até certo ponto”.
Constituir uma família numerosa: quatro, sete, dez ou mais filhos, é sem dúvida um grande desafio. É preciso aprender a esquecer de si próprio. Todo traço de egoísmo deve ser eliminado, mas só há vantagens nisso! Os filhos aprendem uns com os outros as virtudes da boa convivência. A escola da generosidade dos pais marca a vida de todos eles. Nunca se sentem sozinhos (que tristeza desses filhos únicos brincando nos parquinhos!). Todos têm suas tarefas para manter o lar arrumado e crescem conhecendo e respeitando o valor do trabalho bem feito. Certamente também há dificuldades financeiras, mas não são as maiores. Se fosse assim, os ricos teriam muitos filhos, e não é o caso.
Infelizmente, os casais que optam por ter mais filhos costumam encontrar grandes resistências na própria família. ais, tios e irmãos que os amam e lhes desejam o bem, julgam essa escolha como muito penosa e se opõem a ela. No fundo, não há uma confiança na Providência e não compreendem quais são os planos de Deus para o matrimônio. Costumam dizer que ter muitos filhos é “coisa do passado”, quando então deviam ajudar no trabalho do campo. Mas filhos não são cavalos! Hoje as mulheres estudam e têm uma profissão, e por isso muitos pensam que é um desperdício de vida estar em casa cuidando das crianças: é mais importante cultivar o ego construindo uma carreira! Também ouve-se muito que antigamente a vida era mais fácil, mas isso é mentira. Hoje temos mais acesso à saúde, mais escolas, mais opções de lazer e tecnologias que facilitam o trabalho. Atualmente quantos ainda lavam roupas à mão?
Um filho é sempre uma grande alegria para o casal. Certamente custa tempo, dinheiro e esforço, mas vale tudo isso e muito mais! Peçamos que Deus nos ajude a viver o casamento como verdadeira vocação à santidade, e a ter uma visão mais cristã da vida, para julgarmos sempre de acordo com os planos de Deus se podemos acolher mais um filho, ainda que já tenhamos muitos. Afinal, viver bem nossa vocação matrimonial é levá-la adiante com generosidade heroica, numa entrega sem limites aos planos de Deus, que são planos de vida, não de egoísmo.


02/2014

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