Escrito em 11/2008
Nos mitos antigos, e na maioria das crenças atuais, o divino se apresenta como explicação para o mundo natural. Os deuses são aqueles seres que decidem sobre a chuva ou a seca, sobre a fartura ou a miséria. Quando não estão felizes, lançam pragas sobre o povo e, nesse caso, é preciso cumprir vários rituais diferentes para contentá-los. Estes deuses são por demais humanizados e, de certa forma, são carrascos dos homens pois não lhes oferecem a liberdade, mas os escravizam. Sempre pedindo algum agrado para não os castigarem com diversas pragas.
O nosso Deus, que é único e trinitário, é muito diferente. Na sarça ardente revelou Seu nome a Moisés: “Eu sou Aquele que É” (Ex 3, 14). O Deus cristão não é mais um falso deus usado para explicar os mistérios da natureza. Ele é o Criador, que nos deu a inteligência e nos submeteu a criação (Gn 1, 28ss). O homem, na visão cristã, não está mais escravizado pelos mistérios da natureza, Deus lhe deu o domínio sobre ela. Este mesmo Deus, é amor e misericórdia. Não lhe escraviza, como nas outras religiões, mas lhe ofereceu seu próprio Filho para sua redenção.
Apesar dessa superioridade do Deus de Abraão, muitos cristãos parecem querer diminuí-lo atribuindo-lhe um caráter parecido aos deuses pagãos. Quem nunca ouviu falar, por exemplo, que a AIDS é uma praga enviada por Deus, ou que os terremotos foram causados por Deus por causa da iniquidade do povo? Pensar desta forma é “rebaixar” Deus a uma mera explicação de fenômenos naturais. Ele deixa de ser “Aquele que É” para se tornar uma divindade castigadora, sem misericórdia, que usa da natureza para castigar os homens. Na teologia cristã, as coisas ruins acontecem porque nos afastamos de Deus, não porque Ele fica rogando pragas sobre nós.
Entretanto, não é só aspectos mais banais que se diminui o papel de Deus. Apesar da teoria da evolução ser compatível com a revelação cristã, algumas pessoas tentaram colocar Deus num papel mais ativo dentro da teoria. Segundo essas pessoas, a evolução acontece sim, mas em algumas etapas é preciso uma intervenção direta de Deus. É a teoria do design inteligente. Seus defensores argumentam que alguns órgãos, como o olho, por exemplo, não podem ser explicados simplesmente pela evolução. Seria preciso que Deus fizesse o olho. De fato, poucos biólogos discordam que a teoria da evolução ainda não está completa. Existem vários pontos em aberto que não podem ser explicados com o conhecimento atual. Para os adeptos do design inteligente, esses pontos em aberto são prova de que é preciso uma intervenção de Deus e, portanto, seriam prova da existência Dele.
Mas usar Deus para tampar buracos de teorias científicas é uma péssima idéia. Primeiro porque a ciência não é estática. Amanhã ela vai explicar o que não é entendido hoje. É só uma questão de tempo. É assim que o método científico funciona. Vai-se construindo o conhecimento aos poucos. Se vincula-se a existência de Deus a um aspecto científico não entendido hoje, o que será da existência do Criador quando a ciência conseguir explicar aquele fato? Em segundo lugar, como foi dito antes, usar Deus para explicar aspectos da natureza é reduzí-lo às deidades míticas antigas. Nosso Deus é muito maior que isso.
Nestes tempos de debate sobre células troncos, muitas pessoas correram para dizer que o fato de não haver resultados com as células embrionárias prova que elas não devem ser usadas. Parecem querer dizer que Deus permitiu ter resultados com as células tronco adultas mas não com as embrionárias, e que por isso não devemos pesquisar as últimas. Mas não é esse o ponto. Deve-se proibir a pesquisa por motivos éticos, não por falta de resultados. Eles virão se a pesquisa for permitida, não se tenha dúvida disso. Com este tipo de argumentos, só se desvia o foco da questão, que é moral. Aliás, se este fosse um argumento válido, Deus também não teria permitido que se construísse as bombas nucleares, mas somente os aparelhos de tratamento médico baseados em tecnologia similar.
O segundo mandamento é bem claro, “Não pronunciarás o nome do Senhor, teu Deus, em vão” (Ex 20, 7). Como cristão e fã da ciência, penso que o mandamento também condena o uso indevido do nome de Deus para tapar buracos científicos. Mas não é só isso. Não se pode diminuir Deus desta forma para não cair no ridículo de ter-se, no futuro, uma explicação científica para algo que não era atributo de Deus. Se a revelação cristã nos libertou dos misticismos e das divindades da natureza, porque voltar à escravidão?
11/2008
Oi, Alexandre.
ResponderExcluirSeus artigos são interessantes,mas não virão resultados com células troncos embrionárias. A ciência tem testificado isso. att,